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Artigo

O futuro do escoamento de grãos do Centro Oeste

Mauricio Prieto

18/03/2021 10h00

Foto: GOVBA

Por muitos anos, o escoamento da produção de grãos do Centro Oeste para a exportação veio sendo prioritariamente vinculado o modal rodoviário, seja de forma exclusiva, seja com “pontas” rodoviárias se mais se assemelhavam a longas “pernas”.

Esse cenário tem mudado, no sentido de compatibilizar e complementar as atribuições e vocações dos modais rodoviário, ferroviário e fluvial. Tudo com o objetivo melhorar a competitividade desses produtos.

Faremos aqui breve explanação sobre alguns desafios de momento para o atendimento daquele objetivo.

A Malha Norte, sob concessão até 2079 para a Rumo, tem hoje 755 quilômetros em bitola larga, entre Santa Fé do Sul (SP) e Rondonópolis (MT). Em Santa Fé do Sul liga-se à Malha Paulista, que leva ao Porto de Santos, também operada pela Rumo e que teve sua concessão prorrogada (em maio de 2020) para 2058.

A Rumo pretende aditar o contrato de concessão da Malha Norte de forma a prolonga-la até Lucas do Rio Verde (MT), adicionando 600 km à extensão original e levando-a para mais perto dos produtores de grãos.

Tal pretensão já foi apresentada à ANTT, porém não tem a simpatia do Ministério da Infraestrutura (MInfra), ao menos não nesse formato.

O MInfra acredita que extensão de tal porte apoiada em aditivo à concessão (sem licitação, portanto) poderá gerar questionamentos por parte do Tribunal de Contas da União, o TCU.

De fato, a Lei 13.448/2017, apesar de admitir que concessões de ferrovias possam ter novos trechos “com a extensão necessária para atender polos geradores de carga”, por outro lado reza que, para tanto, a concessionária “deverá demonstrar, em relação ao novo trecho, a inexequibilidade econômica de sua exploração segregada do contrato de parceria” (art. 27, §2º).

A posição do ministério é de que o TCU poderia não ter dificuldade em enxergar que haveria investidores interessados em explorar tal trecho em separado, o que daria margem a contestações.

Alternativamente, o MInfra apresentou a possibilidade de viabilizar a execução por meio do chamado Marco Legal das Ferrovias, quando de sua aprovação no Congresso Nacional (PLS 261/2018, em tramitação no Senado Federal, neste momento na Comissão de Serviços de Infraestrutura com emenda substitutiva do relator, para aprovação, desde novembro de 2020).

Resumidamente, o PLS prevê, a exemplo do que já acontece com os portos, a modalidade de exploração sob regime privado (mediante outorga de autorização), mais flexível que a atual, de concessões e permissões.

Nessa modalidade há maior facilidade em atrair o investimento privado na construção e na operação de ferrovias. O escopo é de tanto oferecer maior liberdade para os investidores aplicarem e gerirem seus recursos, como os obrigar a assumir todos os investimentos e todos os riscos do negócio.

A Rumo entende que o modelo proposto, por mais elástico, facilitaria a concorrência de operadores numa mesma área de influência - coisa que na modalidade de concessão não é permitido - diminuindo a garantia de carga e, por consequência, o interesse de grupos investidores no aporte de capital para a implantação.

Por outro lado, o próprio MInfra está a viabilizar a saída portuária norte (Arco Norte) para escoamento de grãos do Centro Oeste, pelo recente asfaltamento e futura concessão do trecho da BR-163 que vai de Sinop (MT) ao porto de Miritituba (PA), junto ao rio Tapajós. A dificuldade fica por conta das chuvas - o chamado inverno amazônico, de novembro a maio - que impedem a progressão das obras.

Em que pese o possível aumento do custo do transporte no trecho após a privatização, ainda assim as condições mais favoráveis levarão a um maior interesse dos transportadores por essa rota, antes quase impraticável.

Da mesma forma com o trecho Miritituba a Santarém (PA), este o maior porto do Arco Norte, no encontro dos rios Tapajós e Amazonas. Entre Miritituba e o trevo de Rurópolis, a BR-163 está integrada com a Transamazônica (BR-230) e passa por processo de asfaltamento. Daí a Santarém, a rodovia encontra-se pavimentada.

Há ainda os 993 km ferroviários da Ferrogrão (EF-170), que correria paralelemente à BR-163, entre Sinop e Miritituba. É a aposta do governo federal para ampliar a capacidade de transporte de grãos no trecho, o que eliminaria a necessidade de duplicação da BR-163 entre aqueles pontos.

Trata-se de projeto com investimento estimado da ordem de R$ 7,3 bilhão. A previsão do MInfra era de que iria a leilão ainda no primeiro trimestre de 2021, mas segue com o status “protocolado” no TCU desde julho de 2020. A informação é de que o relatório dos técnicos do tribunal já está concluído mas detalha alguns problemas.

Passa ainda por vários outros questionamentos, o mais recente resultando na suspensão, por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, da lei que alterava os limites da Unidade de Conservação de Jamaxim, o que permita a implantação da ferrovia.

Além disso, alguns economistas levantam dúvida sobre um mecanismo encontrado pelo ministério para viabilizar o sucesso do futuro leilão. A ideia é criar uma “conta vinculada” com os R$ 2,2 bilhão que estão sendo pagos pela Vale a título de outorga pela renovação antecipada da concessão da Estrada de Ferro Carajás (EFC) até 2057.

O valor poderia ser usado, por exemplo, na hipótese de aumentos de custos não considerados nos estudos (compensações socioambientais, desapropriações, etc.) e reduziria a percepção de risco de possíveis investidores. Porém se trataria, na visão dos críticos, de um subsídio disfarçado.

Apesar das dificuldades que se têm apresentado, o fato é que progredimos muito na facilitação e redução de custo do escoamento da produção do Centro Oeste.

A entrega da responsabilidade da construção, implantação e operação desses corredores para a iniciativa privada, num ambiente de plena segurança jurídica, é de imensa importância para o país. Daí que eventuais atrasos devem servir para aprimorar os modelos.

Depende-se, no entanto, do competente monitoramento por parte do poder concedente, para que se garantam a concorrência justa e a diminuição efetiva do famigerado Custo Brasil.

Mauricio Prieto é sócio diretor da Synerhgon, empresa de consultoria multidisciplinar com foco no resultado. [email protected]

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