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Editorial

Indústria e o risco do círculo vicioso

De acordo com os dados da CNI a participação do Brasil na produção industrial mundial caiu de 1,24%, em 2018, para 1,19%, em 2019

14/09/2020 16h00

Já era esperado, pelos economistas que fazem análises de mercado e produção e por todos aqueles que acompanham de perto o noticiário, que houve uma queda de patamar da indústria brasileira em decorrência da pandemia da Covid-19, até porque não havia como a situação do Brasil ser diferentes daquela enfrentada pelos demais países que foram atingidos antes de nós pela crise sanitária. Mas, em nosso país, uma das diferenças é que, antes mesmo da pandemia, a indústria nacional já se encontrava em trajetória de queda desde 2009.

De acordo com os dados divulgados pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), em estudo denominado Desempenho da Indústria no Mundo, a participação do Brasil na produção industrial mundial caiu de 1,24%, em 2018, para 1,19%, em 2019, sendo este último o piso da série histórica que se iniciou em 1990. Apesar dos percalços, a indústria brasileira figura entre as dez maiores do mundo até 2014. Entre 2015 e 2019, ela foi superada pelas indústrias do México, da Indonésia, da Rússia, de Taiwan, da Turquia e da Espanha, ocupando hoje a 16ª posição.

A perda de participação da indústria brasileira na produção industrial mundial tem sido observada desde meados da década de 1990. Os dados apenas servem para deixar muito claro que a crise econômica brasileira de 2014-2016 intensificou a perda de participação na produção industrial mundial. Uma demonstração cabal é que, enquanto, o PIB da indústria acumulou queda de 10,1%, a agropecuária recuou apenas 2,1% e os serviços caíram 4,9%. Outro fato que aumentou o distanciamento da produção industrial brasileira com o resto do mundo é que, após a queda registrada pela crise financeira mundial de 2009, a produção industrial mundial manteve-se em crescimento.

Na verdade, é preciso destacar que a crise gerada pela pandemia apenas serviu para deixar ainda mais exposta a fragilidade e, principalmente, a falta de competitividade da indústria brasileira na comparação com quase todos os países. Citado em todos os estudos sérios do panorama econômico mundial, o chamado “custo Brasil”, representado pelas deficiências na infraestrutura (transportes, energia, telecomunicações) e nos problemas gerados pela legislação (áreas trabalhista e tributária especialmente) é um grave obstáculo para que a indústria brasileira possa competir em pé de igualdade com seus concorrentes.

Não por acaso, junto com a divulgação dos últimos números do cenário industrial brasileiro, o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, reiterou os apelos já feitos para que haja mudanças capazes de destravar a economia brasileira e aumentem a competitividade da indústria nacional. Como porta-voz do setor, ele citou especificamente a urgente necessidade de aprovação de uma reforma tributária, de uma nova lei do gás e do reforço em investimentos em pesquisas e desenvolvimento, como itens essenciais para que a indústria nacional possa voltar a competir nacionalmente.

O fato que realmente interessa para a sociedade brasileira de modo geral é que a perda da relevância da indústria nacional no cenário mundial é muito preocupante não apenas pelos evidentes prejuízos causados à economia, mas também porque tal quadro significa perda de empregos, o que agrava sobremodo a crise social instalada no Brasil e que tem levado milhões de pessoas para a miséria ou, no mínimo, para patamares de renda incapazes de lhes proporcionar boa qualidade de vida.

Assim, torna-se imperioso que realmente sejam tomadas providências para que o parque industrial brasileiro possa ter condições de competir com os concorrentes e passe a ter a estatura e a importância tão necessárias ao Brasil. Porém, é sempre bom lembrar, sempre tendo em vista a garantia dos direitos dos trabalhadores e a segurança da renda familiar proporcionada por bons salários.

É fundamental evitar as armadilhas criadas quando se pensa apenas em um dos lados, porque isto sempre conduz ao sempre temido círculo vicioso, no qual uma coisa ruim leva a outra pior. Assim, os prejuízos da indústria causam desemprego e a queda na renda das famílias contribui para sobrecarregar um sistema de saúde que já vivia no limite e, agora, quase vai ao fundo do poço com o excesso de demanda provocado pela crise do novo coronavírus.