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Economia

Indicadores iniciais de março aprofundam projeções de retração

“Março pode ter quedas bem fortes, de 10% a 15% no mês contra mês, ou até mais”, diz Solange Srour

07/04/2020 07h38

Foto: Valor Econômico

Os primeiros indicadores de desempenho da economia brasileira em março já apontam a magnitude do impacto que a paralisação do comércio, dos serviços e da indústria pode ter na atividade, assim como o efeito da restrição à circulação de pessoas. Índices registram quedas recordes, no patamar de dois dígitos, e trazem os primeiros sinais da recessão, levando, inclusive, alguns economistas a reduzirem novamente as suas projeções para a variação do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020, com estimativas de contração ainda mais forte.

O licenciamento de automóveis e comerciais leves caiu 35% em relação a fevereiro, enquanto as consultas ao Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) de São Paulo recuaram 34%, e a atividade do comércio diminuiu 16%. O nível de incerteza na economia disparou e a confiança do consumidor e dos empresários desabou.

Menos de um mês após passar a ver retração de 3% no PIB deste ano, o ASA Bank cortou sua estimativa para -5% na sexta-feira. Além de considerar que medidas de isolamento social se estenderão ao menos até o fim de abril, e não mais até meados do mês, a equipe do economista Carlos Kawall avalia que as ações adotadas estão, de fato, paralisando significativamente a atividade.

“Chama atenção relatório disponibilizado pelo Google, que sugere queda das tendências de frequência em restaurantes, cafés, shopping centers e outros centros de varejo e recreação de 71% frente ao normal para o período, até o fim de março”, escrevem os economistas. Eles citam ainda estimativa da Cielo para o faturamento nominal do varejo, de queda   de 21% em março, ante o mês anterior, com queda de 46% para os serviços, e destacam que o consumo de energia no país recuou 3,5% nos últimos 10 dias ante igual período de 2019. Agora, o ASA projeta queda de 0,3% no PIB do primeiro trimestre, ante os três meses anteriores, feitos os ajustes sazonais, e de 7,5% no segundo. As estimativas anteriores eram de -0,2% e -4,5%.

O UBS também piorou sua percepção. A previsão para o desempenho do PIB em 2020, que era de alta de 0,5%, passou para redução de 2%. Para o primeiro trimestre, a projeção foi revista de queda anualizada de 1% para retração de 3,6%. Com o efeito estatístico e o reflexo atrasado da deterioração das condições financeiras, a estimativa para o segundo trimestre mudou de -15% para -20%.

“Março reflete restrições antecipadas no varejo e em serviços devido à pandemia de covid-19”, afirmam os economistas Fabio Ramos e Tony Volpon em relatório. Eles mencionam a queda de 15,9 pontos no índice de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês) de serviços da IHS Markit em março, para 34,5. Foi o maior declínio mensal desde o início da pesquisa para o Brasil, em 2007.

“Março pode ter quedas bem fortes, de 10% a 15% no mês contra mês, ou até mais em alguns casos, como veículos. O varejo pode cair mais de 15%. O que pode contrabalançar um pouco é supermercados”, diz Solange Srour, economista-chefe da ARX Investimentos.

O segmento poderia registrar até uma alta, em torno de 5% ou 6%, estima. Por outro lado, a venda de material de construção pode ter caído cerca de 30%. “Bens duráveis devem ter território bem negativo”, afirma Solange. Por ora, a ARX projeta queda de 0,4% no PIB de janeiro a março.

Economista da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Marcel Solimeo avalia que as vendas maiores de itens básicos não serão suficientes para compensar o tombo em outros setores. Em março, as vendas na capital paulista encolheram 27% sobre igual mês de 2019, aponta medição da ACSP com base em dados da Boa Vista Serviços.

O Indicador de Atividade do Comércio da Serasa Experian reforça essa visão: caiu 16,2% em março, ante fevereiro, feitos os ajustes, maior redução mensal na série histórica, iniciada em 2000. As quedas foram mais intensas para itens cuja compra pode ser postergada, como veículos (-23,1%) e material de construção (-21,9%), e menores nos setores de supermercados (-8,1%) e combustíveis (-5,5%). “A tendência é essa queda se aprofundar e ter novo tombo em abril, porque poderá ser um mês inteiro de comércio fechado”, diz o economista Luiz Rabi.

Mesmo sem conhecer grande parte dos indicadores antecedentes da indústria, já é possível ter uma ideia do quão negativo março foi nas fábricas. O lançamento de novos produtos pelo setor caiu 17%, na comparação com fevereiro, de acordo a Associação Brasileira de Automação (GS1 Brasil), responsável por emitir códigos de barras para os produtos fabricados no país. Já o PMI da indústria passou de 52,3 em fevereiro para 48,4 no mês passado, a perda mais acentuada desde fevereiro de 2017. Números abaixo de 50 indicam contração da atividade.

Bom termômetro para a atividade industrial, o nível de utilização de capacidade instalada (Nuci) da FGV mostrou menor uso do parque produtivo. De fevereiro para março, caiu 0,9 ponto, a 75,3%.

Na indústria automobilística, muitas montadoras anunciaram férias coletivas. Os dados da associação do setor (Anfavea), a serem publicados hoje, devem ajudar nas projeções, diz o economista Rodrigo Nishida, da LCA Consultores. “É difícil fazer inferência a partir dos licenciamentos, mas a perspectiva é que venha um resultado bem ruim na produção. Muitas montadoras já deixaram de fabricar por uma semana. Perder cinco, sete dias úteis é bem significativo”, diz.

Em projeção preliminar, Nishida diz que a indústria como um todo pode cair 9% em março. Esse tombo, porém, não deve ser uniforme. O setor extrativo pode ser menos afetado. “Talvez, o setor de papel e celulose, por exemplo, tenha até contribuição positiva, por causa da demanda de produção para equipamentos hospitalares.”

Já a expedição de papelão ondulado – outro indicador antecedente da indústria – se manteve forte em março, depois de ter batido recorde em fevereiro, diz a presidente da Associação Brasileira de Papelão Ondulado (ABPO), Gabriella Michelucci. Os dados serão divulgados no dia 10. Para Gabriella, o bom desempenho se deve ao perfil dos setores que consomem embalagens de papelão: alimentos industrializados, higiene pessoal, limpeza e farmacêutica têm maior demanda e, por isso, comprado mais.

Fonte: Valor Econômico