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Logística

Empresas portuárias incentivam participação das mulheres no setor

Segundo dados da Antaq, força de trabalho feminina representa apenas 17,3% das vagas nos portos

04/11/2024 07h27

Foto: TCP - Divulgação

Em 2011, o setor portuário brasileiro bateu recorde ao movimentar 886,055 milhões de toneladas de mercadorias. Naquele ano, diante das expectativas do trabalho no porto, Patrícia Silva de Oliveira, com 24 anos, decidiu ingressar em um curso técnico para atuar na área de Logística do setor. Entretanto, alguns obstáculos a fizeram retornar à área de vigilância e, tempos depois, escolheu mesmo investir no serviço de motorista de ônibus, onde trabalhou por cinco anos em uma empresa de transportes paulista.

Ainda assim, o desejo de Patrícia por desafios maiores e de retornar aos portos não cessou. Já em 2019, ela tirou a carteira de motorista tipo E, para dirigir caminhões, e enviou o seu currículo para a DP World, uma empresa multinacional de logística com sede em Dubai, especializada em cargas, operações de terminais portuários, serviços marítimos e zonas francas. Contratada para atuar na operação do Porto de Santos, em São Paulo, Patrícia trabalhou por dois anos como Operadora de ITV (carreta interna) até ser promovida para a função de Monitora de Equipamentos. Hoje, aos 37 anos, ocupa a posição de Supervisora de Operações na empresa.

 

Patrícia Silva de Oliveira - Foto: DP World - Divulgação

“O porto abriu portas que eu nunca quis fechar, especialmente quando olho para o lado e vejo outras mulheres no cais, operando máquinas, fazendo a vistoria de cargas, liderando equipes, entre outras atividades que um dia foram consideradas masculinas”, disse Patrícia Oliveira, que integra os 17,3% do total de vagas ocupadas por mulheres no setor portuário brasileiro de acordo com levantamento divulgado em 2023 pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).

Em face da baixa representatividade de mulheres nos portos do país, que segue a tendência global estimada em 18% pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), empresas brasileiras estão desenvolvendo ações que estimulam a participação feminina no setor para tornar histórias como a de Patrícia cada vez mais comuns.

Porto para Todas

Em seus dez anos de história no Brasil, a DP World registrou um aumento de mais de 200% no número de mulheres no quadro de funcionários. Atualmente, o terminal conta com 297 delas, presentes nas áreas administrativas, como financeiro, jurídico, comercial e Recursos Humanos, e nas operações, sendo que 41% do público feminino desempenha funções operacionais as quais, tradicionalmente, eram majoritariamente ocupadas por homens.

Segundo o diretor de pessoas da DP World, Alcino Therezo, o tema  Empoderamento Feminino compõe uma das três principais áreas de legado que o grupo definiu em sua estratégia de Sustentabilidade, baseado no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 5 (ODS 5) da Organização das Nações Unidas (ONU).

“Temos orgulho de sermos pioneiros na valorização das mulheres no Porto de Santos. Trabalhamos de forma consistente para melhorar a representatividade feminina na companhia e trazer a discussão sobre a importância da diversidade para o nosso dia a dia”, comentou Alcino.

Dentre as ações realizadas pela empresa, estão o “MentorHer”, um programa que consiste em sessões de mentoria com profissionais sêniores para mulheres em ascensão de carreira. Em cinco edições, o programa já certificou mais de 50 participantes. Uma delas foi Juliana Bambini, que entrou em 2010 na DP como estagiária e agora é gerente jurídica. Além de Juliana, a empresa mantém mais de 30 mulheres em cargos de liderança, como supervisoras, coordenadoras, gerentes e diretora, o que representa um salto de 30% em cinco anos.

No levantamento da Antaq, a maioria das companhias do setor portuário entrevistadas apresenta menos de 30% de mulheres em cargos de liderança, com exceção das empresas de cabotagem.

Localizado no estado do Paraná, o Terminal de Contêineres de Paranaguá (TCP) também compõe o percentual da maior parte das empresas com até 30% de mulheres em seu quadro de funcionários. Como informado pelo gerente de recursos humanos e qualidade do TCP, Washington Renan Bohnn, das 341 admissões realizadas em 2024, 27% foram de mulheres, o que supera a média dos anos anteriores.

“Se analisarmos a série histórica de admissões no Terminal nos últimos 10 anos, verificamos um avanço positivo nesta questão. O número de mulheres nos cargos de operação cresceu 126%, e nos cargos de liderança a representatividade feminina aumentou em seis vezes”, afirma Washington.

Solange do Rocio Ramos, operadora de Caminhões de Transporte na TCP  - Foto: Divulgação

Quanto aos treinamentos, ele relata que não há uma iniciativa específica para impulsionamento da participação feminina na TCP, mas existem políticas de inclusão e valorização da diversidade de gêneros, além de cursos disponibilizados periodicamente por meio da Universidade Corporativa  que podem ser atendidos por todos os colaboradores da empresa. Dentre eles, são oferecidas aulas de inglês, de Pacote Office, Power BI, estratégias de comunicação, resolução de problemas e de inteligência emocional.

Ao todo, o Terminal de Contêineres do Paranaguá conta com 1.679 colaboradores, sendo que as mulheres lideram em 52% dos setores administrativos, enquanto no quadro operacional, a mão de obra ainda é majoritariamente masculina, como já revelado pela pesquisa da Antaq.

Equidade é inovação

Para a gerente comercial de armadores da TCP, Carolina Merkle Brown, trabalhar em ambientes predominantemente masculinos pode trazer desafios que exigem preparo e um posicionamento firme e assertivo da mulher. Na sua consideração, esses desafios  também oferecem oportunidades valiosas de desenvolvimento, e é importante que cada profissional saiba explorá-las.

“Muito embora existam características frequentemente atribuídas ao masculino e ao feminino, não devemos tratá-las como regras absolutas, cada pessoa possui talentos que vão além dessas generalizações, e limitar-se a esses critérios é uma abordagem ultrapassada que pode restringir o desenvolvimento de talentos e oportunidades”, assegura Carolina, que acredita que, gradualmente, veremos cada vez mais mulheres em posições de liderança inspirando futuras gerações e contribuindo para um ambiente mais equitativo e produtivo na indústria portuária.

Daniele Midori, operadora de guindaste RTG na TCP - Foto: Divulgação

Para que o cenário de equidade de gênero nos portos brasileiros se torne realidade, a Portonave e a Wilson Sons são mais duas empresas que se dedicam na materialização de ações que fomentam o trabalho feminino em diferentes setores. Situada no Porto fluvial em Navegantes, Santa Catarina, a Portonave possui sete iniciativas com foco nas mulheres.

De acordo com a gerente de Recursos Humanos, Alessandra Santos, todas integram o Programa de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) da empresa, à exemplo do Programa Porto para Elas, da Busca Ativa por Mulheres para Posições nas Áreas Operacionais, do Programa de Apoio à Maternidade e do Enfrentamento ao Assédio no Setor Portuário. Este último, explica Alessandra, tem como base o “Guia de Enfrentamento ao Assédio no Setor Aquaviário” desenvolvido pela Antaq.

Atualmente, a Portonave tem 257 mulheres no quadro de funcionários, o que representa apenas 20% da força de trabalho. Na visão da gerente de RH, os programas são essenciais para aumentar esse número e promover uma cultura organizacional mais inclusiva e equitativa. “Ambientes mais diversos representam maior inovação e diferentes perspectivas. É essencial que as mulheres estejam presentes no setor”, reforça Alessandra. 

Tecon Salvador - Foto: Divulgação

Já a Wilson Sons, operadora de logística portuária e marítima, através do Terminal de Contêineres (Tecon) do Porto de Salvador, na Bahia, oferece o Programa de Qualificação Profissional Porto Delas, em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai-BA). O projeto foi iniciado em 2011 com o objetivo de atrair mais mulheres para o terminal por meio de cursos gratuitos em trilha formativa específica: operação de empilhadeira elétrica, operação de empilhadeira combustão, segurança em eletricidade – NR10-Básico, desenvolvimento humano e ambiental e oficina de diversidade.

Nesta segunda-feira (4), começa uma nova turma do curso, que oferece 30 vagas para mulheres a partir de 18 anos com auxílio alimentação e transporte durante todo o andamento das aulas. Segundo o diretor executivo do Tecon Salvador, Demir Lourenço, a previsão é que o curso seja finalizado em 30 de janeiro de 2025. Ele também explica que essa é algumas das estratégias que a empresa vem traçando ao longo dos anos para contribuir com a inclusão, promoção da equidade e o desenvolvimento de mulheres na operação portuária.

"Uma equipe diversa se reflete na melhoria da performance da nossa atividade e no clima organizacional. Além disso impacta diretamente no desenvolvimento socioeconômico da nossa comunidade, pois amplia os horizontes daquelas que são maioria na composição da sociedade e precisam apenas de uma oportunidade para se desenvolver", assegura Demir.

Comitê de diversidade

Uma ação da Antaq que tem caminhado no sentido de aumentar a equidade de gênero no setor é a criação do Comitê-Geral de Gênero e Diversidade do Setor Aquaviário, que visa fomentar debates e desenvolver ações concretas destinadas à promoção da diversidade e da inclusão no setor portuário e marítimo, além de atuar como um importante agente de transformação social, assegurando que as práticas de diversidade e equidade sejam integradas nas operações e políticas regulatórias do setor aquaviário brasileiro.

O comitê será intersetorial e farão parte, além de representantes da Antaq, membros de entidades nacionais e internacionais. A expectativa é que os nomes sejam apresentados neste mês de novembro e o plano de ação no início do próximo ano.

A criação deste comitê está sendo discutida no âmbito da iniciativa Brasil Sem Misoginia, do Ministério das Mulheres, e do programa Rede Equidade, do Senado Federal, do qual a Antaq faz parte.